Falta informação aos pacientes e de cirurgiões que realizem o procedimento, são empecilhos para que até 90% dos laringectomizados voltem a falar e até a cantar
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Falta informação aos pacientes e de cirurgiões que realizem o procedimento, são empecilhos para que até 90% dos laringectomizados voltem a falar e até a cantar

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No Brasil, foram feitas 157 laringectomias totais entre agosto de 2022 a agosto de 2023, que é a cirurgia  para a remoção da laringe, geralmente indicada no tratamento do câncer de laringe em estágio avançado. E um dos maiores impactos da laringectomia total corresponde a perda da voz, que representa a identidade de uma pessoa e, após a cirurgia, o paciente precisará aprender formas alternativas de comunicação.

Por isso, chama a atenção que no mesmo período (ago./2022 a ago.2023), apenas 62 pacientes (39%) que passaram pelo procedimento de laringectomia total receberam a prótese fonatória, um dispositivo médico já disponível no Sistema Único de Saúde (SUS) e que pode devolver a fala aos pacientes laringectomizados.

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“A reabilitação vocal por prótese fonatória é considerada padrão ouro e protocolo em países como Itália e Holanda, entre outros da Europa. Lá, eles fazem a colocação da prótese no mesmo momento em que é realizada a laringectomia total. Mas, no Brasil, não vemos o mesmo tipo de adesão a esta forma de reabilitação, por vários fatores, entre eles, a falta de informação por parte da população que nem chega a discutir esta opção terapêutica com o médico”, destaca Renato Capuzzo, médico cirurgião de cabeça e pescoço do Hospital de Amor (Barretos/SP) e um dos poucos cirurgiões brasileiros especializados em reabilitação vocal por prótese fonatória.

Até 90% dos laringectomizados podem voltar a falar 

Conforme o Itzhak Brook, médico pediatra, laringectomizados e professor de medicina na Universidade de Georgetown (Washington; EUA), “cerca de 85-90% dos laringectomizados aprendem a falar usando um dos três principais métodos” de reabilitação de fala previstos no SUS. E, segundo ele, os pacientes que passaram pela reabilitação por prótese fonatória “foram os que tiveram os melhores resultados na inteligibilidade da fala seis meses e um ano após a laringectomia total.” 

No Brasil, apesar da portaria SAS/MS 400, 16/11/2019 do Ministério da Saúde, ter estabelecido as diretrizes sobre os serviços de Atenção às Pessoas Estomizadas no SUS e, em seu parágrafo único, mencionar a estomia respiratória, ela não específica quais os tipos de equipamentos devem ser fornecidos aos pacientes que, por exemplo, têm um estoma por conta de uma laringectomia total ou traqueostomia para o tratamento de câncer.

Diretrizes do Ministério da Saúde

Nas diretrizes diagnósticas e terapêuticas do câncer de cabeça e pescoço aprovadas pelo Ministério da Saúde também há registro sobre a necessidade de encaminhamento do paciente oncológico laringectomizado para a reabilitação fonatória, entretanto, sem mencionar os tipos das mesmas.

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“Sem dúvida podermos melhorar a legislação neste ponto, mas hoje o SUS já oferece o mesmo padrão de qualidade terapêutica que os países da Europa, uma vez que a prótese fornecida aqui, é a mesma fornecida lá (Provox Vega). Além disso, estudos e prática clínica comprovam a eficácia, a segurança e melhora da qualidade de vida para os pacientes, gerando custo-efetividade para o serviço de saúde que adota este tipo de reabilitação fonatória”, afirma Fabiano Castro, diretor geral da Atos Medical, empresa que fornece aos sistemas público e privado de saúde do Brasil dispositivos médicos para laringectomia e traqueostomia, inclusive as próteses fonatória e as laringes eletrônicas, utilizadas na reabilitação vocal.

Mais que tratar o câncer, uma questão de saúde mental 

Segundo estimativas do Instituto Nacional de Câncer (Inca), mais de 23 mil brasileiros (quase 8 mil/ano) devem ter câncer de laringe até 2025. Esse é um dos tipos mais comuns (25%) entre os tumores de cabeça e pescoço e atinge principalmente homens acima dos 40 anos, tendo como principais fatores de risco o tabagismo e o consumo excessivo de bebida alcoólica. 

“Quando o único tratamento possível é a laringectomia total, além da questão oncológica, outro impacto muito importante para o paciente é a perda da fala. Isso afeta não só a sua comunicação, sua interação social, mas também o seu emocional, a sua saúde mental. Neste sentido, a reabilitação vocal por prótese fonatória tem se mostrado extremamente satisfatória para manter o equilíbrio e a qualidade de vida destes pacientes.”, ressalta o cirurgião Renato Capuzzo.

Assim como muitos especialistas, o cirurgião do Hospital de Amor acredita que é importante a realização de um intenso e contínuo trabalho informativo e educacional junto à população, aos serviços de saúde e, especialmente, junto aos gestores sobre os benefícios da reabilitação por prótese para estomizados, já que isso, pode – a médio e longo prazos, reduzir custos do setor, inclusive, com reinternações e tratamentos por complicações da estomia ou de distúrbios biopsicossociais decorrentes da perda da fala.